terça-feira, 24 de agosto de 2010

Esta coisa de gostar...

Esta coisa de gostar de alguém não é para todos e, por vezes – em mais casos do que se possa imaginar – existem pessoas que pura e simplesmente não conseguem gostar de ninguém. Esperem lá, não é que não queiram – querem! – mas quando gostam – e podem gostar muito – há sempre qualquer coisa que os impede. Ou porque a estrada está cortada para obras de pavimentação. Ou porque sofremos de diabetes e não podemos abusar dos açucares. Ou porque sim e não falamos mais nisto. Há muita gente que não pode comer crustáceos, verdade? E porquê? Não faço ideia, mas o médico diz que não podemos porque nascemos assim e nós, resignados, ao aproximar-se o empregado de mesa com meio quilo de gambas que faz favor, vamos dizendo: "Nem pensar, leve isso daqui que me irrita a pele".
Ora, por vezes, o simples facto de gostarmos de alguém pode provocar-nos uma alergia semelhante. E nós, sabendo-o, mandamos para trás quando estávamos mortinhos por ir em frente. Não vamos.. E muitas das vezes, sabendo deste nosso problema, escolhemos para nós aquilo que sabemos que, invariavelmente, iremos recusar. Daí existirem aquelas pessoas que insistem em afirmar que só se apaixonam pelas pessoas erradas. Mentira. Pensar dessa forma é que é errado, porque o certo é perceber que se nós escolhemos aquela pessoa foi porque já sabíamos que não íamos a lado nenhum e que – aqui entre nós – é até um alívio não dar em nada porque ia ser uma chatice e estava-se mesmo a ver que ia dar nisto. E deu. Do mesmo modo que no final de 10 anos de relacionamento, ou cinco, ou três, há o hábito generalizado de dizermos que aquela pessoa com quem nós nos casámos já não é a mesma pessoa, quando por mais que nos custe, é igualzinha. O que mudou – e o professor Júlio Machado Vaz que se cuide – foram as expectativas que nós criamos em relação a ela. Impressionados?
Pois bem, se me permitem, vou arregaçar as mangas. O que é díficil – dizem – é saber quando gostam de nós. E, quando afirmam isto, bebo logo dois dry martinis para a tosse. Saber quando gostam de nós? Mas com mil raios, isso é o mais fácil porque quando se gosta de alguém não há desculpas nem " ai que amanhã não dá porque tenho muito trabalho", nem " ai que hoje era bom mas tenho outra coisa combinada" nem " ai que não vi a tua chamada não atendida".
Quando se gosta de alguém – mas a sério, que é disto que falamos – não há nada mais importante do que essa outra pessoa. E sendo assim, não há sms que não se receba porque possivelmente não vimos, porque se calhar estava a passar num sítio sem rede, porque a minha amiga não me deu o recado, porque não percebi que querias estar comigo, porque recebi as flores mas pensava não serem para mim, porque não estava em casa quando tocaste.
Quando se gosta de alguém temos sempre rede, nunca falha a bateria, nunca nada nos impede de nos vermos e nem de nos encontrarmos no meio de uma multidão de gente. Quando se gosta de alguém não respondemos a uma mensagem só no final do dia, não temos acidentes de carro, nem nunca os nossos pais se sentiram mal a ponto de nos impossibilitarem o nosso encontro. Quando se gosta de alguém, ouvimos sempre o telefone, a campaínha da porta, lemos sempre a mensagem que nos deixaram no vidro embaciado do carro desse Inverno rigoroso. Quando se gosta de alguém – e estou a escrever para os que gostam – vamos para o local do acidente com a carta amigável, vamos ter com ela ao corredor do hospital ver como estão os pais, chamamos os bombeiros para abrirem a porta, mas nada, nada nos impede de estar juntos, porque nada nem ninguém é mais importante, do que nós.

(Fernando Alvim)

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

(something brings me back. to you)


Ela garantiu-me. Naquele dia, embora parecesse estranho, o cheiro dele estava a fazer-lhe companhia. Desde o primeiro acorde da manhã, de repente cheirava-o, nas brisas que vinham ao seu encontro, sem que ela pensasse, ou quisesse sequer. Era como se ele estivesse colado ao corpo dela e o próprio odor dela já fosse o dele. Uma confusão, eu sei... mas tive a certeza de que falava verdade. Aqueles olhos de mel, límpidos e brilhantes, não estavam a mentir. Será que naquele dia em especial ele queria dizer-lhe alguma coisa? Era estranho aquele cheiro. Perseguia-a, e estava já a assustá-la. Para quem é céptico esta conversa não faz qualquer sentido, mas era surreal e parecia que podia ser algo mais do que aparentemente parecia. Um cheiro banal, porém o dele. Teria algum significado?
Ela não negou. Era bom, o cheiro era maravilhoso (como não haveria de ser?) E não era de perfume. Estou a falar de essência, é uma questão de pele. Pele com pele. Puramente só isso.
Por muito que ali estivesse presente o cheiro dele, ela estava disposta a esquecê-lo. Porque, como disse, aquele coração agitado e distraído pouco sabia do que o dela, romântico e inseguro, precisava.
E é verdade: quando não sabemos o que o outro quer (e pior, nem queremos sequer dar-nos a esse trabalho), há sempre tanto que fica por dar... tanto, tanto...
Espero que sejas feliz. Tu mereces um coração como os teus olhos. De mel.